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terça-feira, 22 de novembro de 2011

A fonte


Ri muito ao me lembrar quando um dia de manhã o pedreiro entrou lá em casa. Era um sábado bem cedo, umas sete horas. Ele tinha tocado o interfone para que eu abrisse a porta da rua. Até ele subir os dois lances de escada, eu tinha um minuto! O que faria? Pentearia o cabelo e tiraria o resto borrado da maquiagem, ou guardaria nossas roupas jogadas pela sala – a calcinha escancarada no encosto do sofá, a meia de nylon em cima do abajur, a gravata embolada no chão, roupas caídas por toda parte.

Um batom, sempre. Ajeitar a cara, sempre. Casa fica para depois.

Sentou-se à minha frente. Não sei se reparou em alguma coisa. Eu ainda na ressaca-furor da véspera, desconhecia o passo a seguir. A cada olhada na lateral que eu dava, descobria mais coisas impossíveis (como meu soutien) equilibradas na “sustentável leveza do ser”, pois se estendesse a mão num gesto – digamos assim – sistemático, a dúvida seria: esconder rapidamente ou equilibrar a peça em frente aos meus olhos, como a dizer “disgusting!”, com a cara de preparada surpresa de um inglês. Eu não sabia.

Não pude oferecer nem um café, que aliás, não sei fazer direito até hoje. Como ir à cozinha e deixar as provas do crime pela sala?
Decidi ficar falando com charme ao pedreiro de olho azul, atraindo sua atenção ao discurso, manipulando-o. Inventei algum outro assunto e terminei a conversa louca que eu pretendia lógica.

Quando ele foi embora, olhei-me ao espelho. A camisa do Marquinhos, três ou quatro números maior que o meu, abotoada errada, um lado mais curto. Eu jurava que estava com o vestidinho de fazer faxina. Mas mesmo com o cabelo bagunçado, os olhos cansados de quem não dormiu, eu estava sexy. Uau.
Olhei para a cama, vi a “fonte” largada displicente, como tudo em casa, ressonando levemente. Deitei-me ao seu lado, puxei-o para mim - com a esperança de recomeçar tudo de novo.


  Monique                                                                                           

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